terça-feira, 18 de setembro de 2007

O Soldadinho de chumbo (Hans Christian Andersen)

Povo, eu lembro de ter escutado esta história pela primeira vez quando criança, num pograma de rádio que passava as 8:00h da manhã. Eu acordava cedinho para escutar diáriamente uma história. Lembro que esta história me fez chorar, é tão triste. Hoje, sabe-se da importâncias destas histórias para a psique da criança, de seu efeito catártico, da possibilidade de suplencia.
é isso aí, com vocês uma história de amor entre dois brinquedos.


Numa loja de brinquedos havia uma caixa de papelão com
vinte e cinco soldadinhos de chumbo, todos iguaizinhos, pois
haviam sido feitos com o mesmo molde. Apenas um deles
era perneta: como fora o último a ser fundido, faltou chumbo
para completar a outra perna. Mas o soldadinho perneta logo
aprendeu a ficar em pé sobre a única perna e não fazia feio ao
lado dos irmãos.
Esses soldadinhos de chumbo eram muito bonitos e
elegantes, cada qual com seu fuzil ao ombro, a túnica
escarlate, calça azul e uma bela pluma no chapéu. Além disso,
tinham feições de soldados corajosos e cumpridores do dever.
Os valorosos soldadinhos de chumbo aguardavam o
momento em que passariam a pertencer a algum menino.
Chegou o dia em que a caixa foi dada de presente de
aniversário a um garoto. Foi o presente de que ele mais gostou:
— Que lindos soldadinhos! — exclamou maravilhado.
E os colocou enfileirados sobre a mesa, ao lado dos outros
brinquedos. O soldadinho de uma perna só era o último da fileira.
Ao lado do pelotão de chumbo se erguia um lindo
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castelo de papelão, um bosque de árvores verdinhas e, em
frente, havia um pequeno lago feito de um pedaço de espelho.
A maior beleza, porém, era uma jovem que estava em
pé na porta do castelo. Ela também era de papel, mas vestia
uma saia de tule bem franzida e uma blusa bem justa. Seu
lindo rostinho era emoldurado por longos cabelos negros,
presos por uma tiara enfeitada com uma pequenina pedra azul.
A atraente jovem era uma bailarina, por isso mantinha
os braços erguidos em arco sobre a cabeça. Com uma das
pernas dobrada para trás, tão dobrada, mas tão dobrada, que
acabava escondida pela saia de tule.
O soldadinho a olhou longamente e logo se apaixonou, e
pensando que, tal como ele, aquela jovem tão linda tivesse uma
perna só.
“Mas é claro que ela não vai me querer para marido”,
pensou entristecido o soldadinho, suspirando. “Tão elegante,
tão bonita… Deve ser uma princesa. E eu? Nem cabo sou,
vivo numa caixa de papelão, junto com meus vinte e quatro
irmãos”.
À noite, antes de deitar, o menino guardou os
soldadinhos na caixa, mas não percebeu que aquele de uma
perna só caíra atrás de uma grande cigarreira.
Quando os ponteiros do relógio marcaram meia-noite,
todos os brinquedos se animaram e começaram a aprontar
mil e uma. Uma enorme bagunça!
As bonecas organizaram um baile, enquanto o giz da
lousa desenhava bonequinhos nas paredes. Os soldadinhos
de chumbo, fechados na caixa, golpeavam a tampa para sair
e participar da festa, mas continuavam prisioneiros.
Mas o soldadinho de uma perna só e a bailarina não
saíram do lugar em que haviam sido colocados. Ele não
conseguia parar de olhar aquela maravilhosa criatura. Queria
ao menos tentar conhecê-la, para ficarem amigos.
De repente, se ergueu da cigarreira um homenzinho
muito mal-encarado. Era um gênio ruim, que só vivia
pensando em maldades. Assim que ele apareceu, todos os
brinquedos pararam amedrontados, pois já sabiam de quem
se tratava.
O geniozinho olhou a sua volta e viu o soldadinho,
deitado atrás da cigarreira.
— Ei, você aí, por que não está na caixa, com seus
irmãos? — gritou o monstrinho.
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Fingindo não escutar, o soldadinho continuou imóvel,
sem desviar os olhos da bailarina.
— Amanhã vou dar um jeito em você, você vai ver!
— gritou o geniozinho enfezado. — Pode esperar.
Depois disso, pulou de cabeça na cigarreira, levantando
uma nuvem que fez todos espirrarem.
Na manhã seguinte, o menino tirou os soldadinhos de
chumbo da caixa, recolheu aquele de uma perna só, que estava
caído atrás da cigarreira, e os arrumou perto da janela. O
soldadinho de uma perna só, como de costume, era o último
da fila.
De repente, a janela se abriu, batendo fortemente as
venezianas. Teria sido o vento, ou o geniozinho maldoso? E
o pobre soldadinho caiu de cabeça na rua.
O menino viu quando o brinquedo caiu pela janela e
foi correndo procurá-lo na rua. Mas não o encontrou. Logo
se consolou: afinal, tinha ainda os outros soldadinhos, e todos
com duas pernas.
Para piorar a situação, caiu um verdadeiro temporal.
Quando a tempestade foi cessando, e o céu limpou um pouco,
chegaram dois moleques. Eles se divertiam, pisando com os
pés descalços nas poças de água. Um deles viu o soldadinho
de chumbo e exclamou:
— Olhe! Um soldadinho! Será que alguém jogou fora
porque ele está quebrado?
— É, está um pouco amassado. Deve ter vindo com a
enxurrada.
— Não, ele está só um pouco sujo.
— O que nós vamos fazer com um soldadinho só?
Precisaríamos pelo menos meia dúzia, para organizar uma
batalha.
— Sabe de uma coisa? — Disse o primeiro garoto. —
Vamos colocá-lo num barco e mandá-lo dar a volta ao mundo.
E assim foi. Construíram um barquinho com uma folha
de jornal, colocaram o soldadinho dentro dele e soltaram o
barco para navegar na água que corria pela sarjeta.
Apoiado em sua única perna, com o fuzil ao ombro,
o soldadinho de chumbo procurava manter o equilíbrio. O
barquinho dava saltos e esbarrões na água lamacenta,
acompanhado pelos olhares dos dois moleques que,
entusiasmados com a nova brincadeira, corriam pela
calçada ao lado.
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Lá pelas tantas, o barquinho foi jogado para dentro de
um bueiro e continuou seu caminho, agora subterrâneo, em
uma imensa escuridão. Com o coração batendo fortemente, o
soldadinho voltava todos seus pensamentos para a bailarina,
que talvez nunca mais pudesse ver.
De repente, viu chegar em sua direção um enorme rato
de esgoto, olhos fosforescente e um horrível rabo fino e
comprido, que foi logo perguntando:
— Você tem autorização para navegar? Então? Ande,
mostre-a logo, sem discutir.
O soldadinho não respondeu, e o barquinho continuou
seu incerto caminho, arrastado pela correnteza. Os gritos do
rato do esgoto exigindo a autorização foram ficando cada vez
mais distantes.
Enfim, o soldadinho viu ao longe uma luz, e respirou
aliviado; aquela viagem no escuro não o agradava nem um
pouco. Mal sabia ele que, infelizmente, seus problemas não
haviam acabado.
A água do esgoto chegara a um rio, com um grande
salto; rapidamente, as águas agitadas viraram o frágil
barquinho de papel.
O barquinho virou, e o soldadinho de chumbo afundou.
Mal tinha chegado ao fundo, apareceu um enorme peixe que,
abrindo a boca, engoliu-o.
O soldadinho se viu novamente numa imensa
escuridão, espremido no estômago do peixe. E não deixava
de pensar em sua amada: “O que estará fazendo agora sua
linda bailarina? Será que ainda se lembra de mim?”.
E, se não fosse tão destemido, teria chorado lágrimas
de chumbo, pois seu coração sofria de paixão.
Passou-se muito tempo — quem poderia dizer quanto?
E, de repente, a escuridão desapareceu e ele ouviu quando
falavam:
— Olhe! O soldadinho de chumbo que caiu da janela!
Sabem o que aconteceu? O peixe havia sido fisgado por
um pescador, levado ao mercado e vendido a uma cozinheira. E,
por cúmulo da coincidência, não era qualquer cozinheira, mas
sim a que trabalhava na casa do menino que ganhara o soldadinho
no aniversário. Ao limpar o peixe, a cozinheira encontrara dentro
dele o soldadinho, do qual se lembrava muito bem, por causa
daquela única perna.
Levou-o para o garotinho, que fez a maior festa ao
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revê-lo. Lavou-o com água e sabão, para tirar o fedor de peixe,
e endireitou a ponta do fuzil, que amassara um pouco durante
aquela aventura.
Limpinho e lustroso, o soldadinho foi colocado sobre
a mesma mesa em que estava antes de voar pela janela. Nada
estava mudado. O castelo de papel, o pequeno bosque de
árvores muito verdes, o lago reluzente feito de espelho. E, na
porta do castelo, lá estava ela, a bailarina: sobre uma perna
só, com os braços erguidos acima da cabeça, mais bela do
que nunca.
O soldadinho olhou para a bailarina, ainda mais
apaixonado, ela olhou para ele, mas não trocaram palavra
alguma. Ele desejava conversar, mas não ousava. Sentia-se
feliz apenas por estar novamente perto dela e poder amá-la.
Se pudesse, ele contaria toda sua aventura; com certeza a
linda bailarina iria apreciar sua coragem. Quem sabe, até se
casaria com ele…
Enquanto o soldadinho pensava em tudo isso, o
garotinho brincava tranqüilo com o pião.
De repente como foi, como não foi — é caso de se
pensar se o geniozinho ruim da cigarreira não metera seu nariz
—, o garotinho agarrou o soldadinho de chumbo e atirou-o
na lareira, onde o fogo ardia intensamente.
O pobre soldadinho viu a luz intensa e sentiu um forte
calor. A única perna estava amolecendo e a ponta do fuzil
envergava para o lado. As belas cores do uniforme, o vermelho
escarlate da túnica e o azul da calça perdiam suas tonalidades.
O soldadinho lançou um último olhar para a bailarina,
que retribuiu com silêncio e tristeza. Ele sentiu então que seu
coração de chumbo começava a derreter — não só pelo calor,
mas principalmente pelo amor que ardia nele.
Naquele momento, a porta escancarou-se com
violência, e uma rajada de vento fez voar a bailarina de papel
diretamente para a lareira, bem junto ao soldadinho. Bastou
uma labareda e ela desapareceu. O soldadinho também se
dissolveu completamente.
No dia seguinte. a arrumadeira, ao limpar a lareira,
encontrou no meio das cinzas um pequenino coração de
chumbo: era tudo que restara do soldadinho, fiel até o último
instante ao seu grande amor.
Da pequena bailarina de papel só restou a minúscula pedra
azul da tiara, que antes brilhava em seus longos cabelos negros.

Um comentário:

Unknown disse...

Essa eh uma lnda historia de amor...Que tocou muito meu coracao pela fdelidade ao amor do soldadinho pela bailarina...
Realmente eh uma linda fabula:)